16 dezembro 2015

resenha do Professor Mário Carneiro ao livro 'Cartas de José Régio com seu irmão Antonino'

Caro Filipe,

Ontem à noite acabei de ler o seu livro Correspondência de José Régio com seu irmão Antonino (nov. 2015).


Achei a sua introdução muito interessante, não só pela informação que faculta ao leitor, e que é relevante para uma leitura mais rica e contextualizada das cartas, mas também pelas observações que faz acerca das personalidades e da história pessoal de ambos.

Pareceu-me muito pertinente a opção que tomou de incluir «Recordação de Antonino», de José Constantino Maia. Dá-nos um acesso privilegiado a certos elementos muito significativos da personalidade deste irmão de Régio.

Gostei particularmente das cartas 1 e 2. São interessantíssimos a descrição e os comentários que Antonino faz da e sobre a «sua» Vila do Conde. Igualmente curiosa é, na carta 2, a forma como Antonino expressa a sua leitura psicanalítica da novela «O Vestido Cor de Fogo».

Aliás, estas duas cartas criam no leitor uma expectativa sobre as cartas seguintes de Antonino que infelizmente não se pôde confirmar, pois o problema das partilhas sobrepôs-se a quase tudo o resto, não deixando grande espaço à manifestação do seu lado (provavelmente) mais culto e criativo (este último ilustrado, por exemplo, na passagem da carta 26, em que diz «Nós os portugueses solteiros que vivemos longe da Pátria e não temos família aqui, passamos o Natal e o Ano Novo na boîte dançando e bebendo na companhia de horizontais de todas as nacionalidades»).

Neste ponto, o leitor fica, pelo menos eu fiquei, com o desejo de que Antonino não tivesse morrido tão cedo. Certamente que o desenvolvimento da correspondência entre ambos (após a resolução da «problemática» das partilhas) talvez nos tivesse revelado, relativamente a Antonino, uma personagem bem sui generis, e, relativamente a Régio, o aprofundamento de alguns elementos do seu carácter e personalidade que se evidenciam nestas cartas. Fica-se com pena de que assim não tenha acontecido.

Duas notas finais: gostei do modo como estruturou o livro e que tenha decidido apresentar uma versão desencriptada de «Uma Anedota de Gaiatos».

Concluindo: deixo-lhe as minhas felicitações.

Receba o meu abraço,

Mário Carneiro

Investigador do Centro de Filosofia da Universidade de Lisboa e do Instituto de Filosofia da Universidade do Porto

22 novembro 2015

20 de nov. 2015 - lançamento do carteio de José Régio com seu irmão Antonino

Surpreendente esta edição das cartas trocadas entre José Régio e o seu irmão Antonino que, em 1924, com 19 anos de idade, emigrara para o Brasil e que nunca mais se reuniria com a sua família.


Extrato do 'Estudo Introdutório':


«José e seu irmão Antonino nasceram no mesmo berço e receberam a mesma formação primordial, mas esta produziu resultados divergentes que se evidenciaram logo quando o primeiro rumou a Coimbra para seguir estudos superiores de Letras, optando o segundo, pouco antes de o seu irmão concluir a licenciatura, por uma precoce vida de trabalho e partindo com 19 anos de idade para o Recife, capital do Estado do Pernambuco, no Brasil.

Tal como discorre Régio em carta ao seu amigo Flávio Gonçalves, o Brasil perfilava-se para Antonino como o Eldorado de sonho que o sucesso do tio-avô brasileiro lhe figurava promissor, esse José Maria Pereira que em 09.11.1844, com 14 anos de idade, para escapar às dificuldades de ter nascido entre mais 13 irmãos, tirara passaporte para o mesmo Pernambuco, vindo depois, durante a década de 70 do séc. xix, a fixar-se na capital do Império do Brasil, o Rio de Janeiro. Terá sido a consciência de que a família devia o seu confortável estatuto económico e social à aventura do tio-avô dos irmãos Reis Pereira pelas terras brasílicas que terá atenuado a objeção paterna à emigração de Antonino para o Nordeste brasileiro.

Podemos dizer que Antonino triunfou no Brasil e que simultaneamente se quedou muito aquém dos seus sonhos. Aquém, porque, manifestamente, não conheceu no Recife o sucesso que o seu tio-avô obtivera décadas antes e acabou confinado à mediania de uma existência de empregado de escritório, probo e bem-comportado. Mas a sua emigração foi também um êxito, já que conseguiu integrar-se e aculturar-se, conquistando uma vida estável e socialmente acomodada. Sem essa adaptação ele teria sido forçado a regressar à sua terra natal em falência económica e moral, como sucedera a Manuel da Bouça, o anti-herói de Emigrantes de Ferreira de Castro».









Imagens do lançamento:




Créditos: Florindo Madeira, Filipe Pereira

Ver também:


20 outubro 2015

Mário Cláudio fala sobre José Régio

Escritaria 2015, por Mário Rufino














Durante a entrevista, as recordações do autor concentraram-se na sua relação com outros escritores. Depois de demonstrar a sua proximidade afectiva com Lídia Jorge, Mário Cláudio falou um pouco sobre Eugénio de Andrade, Agustina Bessa-Luís e José Régio.

Curiosa foi a história que Mário Cláudio contou sobre José Régio, com quem conviveu pouco.

Contou o autor homenageado que um dia dirigiu-se a José Régio para lhe pedir que lesse alguns textos seus.

“São versos?” perguntou José Régio.

“ Sim, são versos”.

“Eu estou farto de versos”.

“É natural”, respondeu Mário Cláudio, “O senhor já os escreve há tantos anos.”


extraído de http://diariodigital.sapo.pt/news.asp?id_news=795253 (atualmente offline)

22 setembro 2015

Exposição "Arte e fraternidade: artistas e cidades irmanadas"



Régio durante as filmagens de As pinturas do meu irmão Julio, obra de Manoel de Oliveira.

A Câmara Municipal de Vila do Conde associada à sua congénere de Portalegre prestam homenagem a José Régio, nos 114 anos do seu nascimento, mantendo viva a memória de um dos maiores vultos das letras de Portugal. Escritor que é património comum de ambos os municípios e através do qual se gerou a geminação que os une.

A exposição "Arte e Fraternidade Artistas e Cidades irmanadas" permite-nos revisitar algumas das obras artísticas e literárias mais relevantes e significativas da autoria de Régio e Julio e, simultaneamente, dar a conhecer as criações, no campo da arte e da literatura, que supomos serem menos conhecidas do grande público, de seus irmãos, Apolinário e João Maria.

Vila do Conde espraiada entre pinhais rio e mar e Portalegre cidade do alto Alentejo juntam-se num hino de louvor ao poeta, tal como ele o fez cantando, como ninguém, as suas cidades de eleição.

Teatro Municipal de Vila do Conde
Inauguração no dia 26 de setembro às 21h30
Terça a sexta: 10h30/12h30 e 14h00/19h00
Sábado: 10h30/12h30 e 14h00/19h00 e 20h30/23h30 (exceto em dias de espetáculo)
Domingo: 15h00/19h00 e 21h00/23h30 (exceto em dias de espetáculo)

04 setembro 2015

Tradução do 'Cântico negro' em romeno



Cântec negru
José Régio (1901-1969)

Unii spun, cu braţele deschise,vino aici,
făcându-mi ochi dulci. fiind convinşi
c-ar fi bine, dacă aşi asculta
când imi spun: “vino aici”!
Eu îi privesc, cu ochi galeşi
(obosiţi, dar plini de ironie)
şi îmi pun braţele în piept,
fiind sigur că nu îi voi urma…
asta este clipa mea de glorie:
să creez o lume barbară!
să nu emulez pe nimeni.
- pentru că trăiesc cu aceeaşi reticenţă
din clipa când m-am desprins din pântecele mumei mele
nu, nu voi merge acolo! Merg doar acolo
unde mă îndeamnă paşii mei…
ca să aflu rostul la care nimeni nu are răspuns
atunci de ce tot mai repeţi: “vino aici”?


Mai degrabă m-aşi târâ prin drumurile pline de noroi,
să flutur în vânt,
ca o cârpă, târându-mi picioarele însângerate, după mine,
decât să merg acolo…
m-am născut pe lume,
doar ca să deflorez pădurile virgine
să-mi îndrept pasii pe plaja nebătută de nimeni!
ori şi ce altceva nu face doi bani.


cum v-aţi închipui să fiţi voi
cei ce m-ar îndemna, cu unelte si curaj
să înving propriile mele obstacole?
sângele strămoşilor nostri curg in venele voastre
iar vouă vă place calea uşoară
mie îmi place Infinitul şi Mirajul
îmi plac adâncurile, torenţii, deşertul…
hai, du-te! Ai drumuri,
ai grădini, ai brazde de flori,
ai o naţiune, ai case,
ai legi, tratate, filosofi şi oameni inţelepţi.
Eu am Folia mea!
o salt sus, ca o făclie arzând în întunericul nopţii,
simţind spumă, sânge şi cântec pe buzele mele…
Dumnezeu si Diavolul mă călăuzesc de-o seamă şi nimeni altcineva!
fiecare a avut un tată, fiecare a avut o mumă;
dar eu, neavând un început sau un sfârşit,
am purces din împreunarea lui Dumnezeu cu Diavolul.


ah! şi nu-mi oferi bunele tale intenţii!
nu-mi cere înţelesuri!
nu-mi spune: “vino aici”!
viaţa mea este un vârtej necontrolat
e un val care se înalţă
e un atom în plus care face explozie
nici nu ştiu în ce direcţie voi sfârşi
nici nu ştiu unde merg,
- ştiu doar că nu merg acolo!


(Rendered in Romanian
by Constantin ROMAN, London,
© 2012, Copyright Constantin ROMAN)


Régio em Abrantes

“Trovas & Canções, actores, poetas e cantores” é o nome do espetáculo que vai subir ao palco do Cineteatro S. Pedro, em Abrantes, na noite de 11 de setembro de 2015, a partir das 21h30.

Um espetáculo inédito que reúne três gerações de atores e outros profissionais em redor da figura do actor Ruy de Carvalho que estará em palco com o filho e o neto, João de Carvalho e Henrique de Carvalho. Em palco estará também a fadista e actriz Ana Marta, prémio Amália revelação 2011, com Diogo Tavares e Ricardo Gama.

“Trovas & Canções, actores, poetas e cantores” mistura teatro, poesia e canções num espetáculo onde os atores interpretam poetas portugueses, tais como Camões, Ary dos Santos, Pedro Homem de Mello, Zeca Afondo, Florbela Espanca, José Régio, Gil Vicente, entre outros.

Os bilhetes custam dez euros e estão à venda no Welcome Center (loja de turismo) no Largo 1º de Maio, através do e-mail: turismo@cm-abrantes.pt ou do contacto: 241 330 100.


06 julho 2015

Cinema “made in” Vila do Conde



Há alguns anos que à volta do Festival Curtas de Vila do Conde se estabeleceu a possibilidade de se produzirem, também, alguns filmes. Da colheita deste ano são hoje exibidos, em estreia, “A Glória de Fazer Cinema em Portugal”, de Manuel Mozos, que aborda a relação do escritor vila-condense José Régio com a sétima arte, e "Vila do Conde Espraiada", que aproveita este famoso verso, também de Régio, para uma viagem por imagens de arquivo em forma de carta-cassete de amor.

Dia 6 de julho de 2015 - para ver às 22h30, no Teatro Municipal.

Bilhetes a 3,50€.


http://lazer.publico.pt/noticias/350585_sugestoes-do-dia-6-de-julho#

Edição revista e aumentada de "Amália quis Deus que fosse o meu nome"


A obra “Amália quis Deus que fosse o meu nome”, do sociólogo e produtor radiofónico Miguel Ferraz, editada em dezembro do ano passado, foi reeditada com “a inclusão de novos depoimentos”, nomeadamente do realizador de rádio António Sala.

A obra resulta de uma entrevista efetuada na casa de Amália, em Lisboa, em novembro de 1989, ano no qual celebrou o cinquentenário de carreira artística.


Nesta entrevista, Amália Rodrigues salientou as influências árabes e também marítimas, na origem do fado, e define esta expressão como “uma queixa”.

“Acho que temos uma influência árabe que os espanhóis também têm, além disso, o fado nasceu no mar”, afirma a fadista, na entrevista, citando em seguida o poema “Fado Português”, de José Régio, que gravou com música de Alain Oulman, para acrescentar que "o fado é uma queixa e nós temos muita razão de nos queixarmos... vida fora”.

Na entrevista, a fadista revela ainda que era “uma pessoa sempre em conflito interior, com aquilo que ouvia, com aquilo que via” e a “fazia muitas vezes chorar e ficar triste”.


Régio chega à Roménia

Georgiana Bărbulescu, conhecida lusista (e lusófila) romena, está neste momento a traduzir as Histórias de mulheres para o idioma dos latinos do Oriente. A obra de Régio começa assim a tocar um dos extremos do arco da latinidade, esse espaço linguístico-cultural imenso que começa no Oriente em Sulina, cidade situada no Delta romeno do Danúbio, e termina nas praias mexicanas do Pacífico, em Tijuana, no extremo ocidental dos países latinófonos, abraçando a metade do Hemisfério Norte - espaço no qual Portugal ocupa o centro.

O interesse de Georgiana Bărbulescu pela obra de Régio é já antigo: foi em 2002, no âmbito do Centro de Língua Portuguesa de Bucareste, que a poetisa e tradutora publicou uma brochura bilingue com cinco poemas de José Régio. Algumas dessas traduções foram depois publicadas numa revista literária do seu país, constituindo a primeira apresentação de Régio aos romenos.

Georgiana Bărbulescu tem desenvolvido na Roménia vários trabalhos poéticos e de ficção sobre poetas portugueses, especialmente em torno de dois nomes que mais interessaram Régio e que ele mais aprofundadamente estudou: Mário de Sá-Carneiro e Florbela Espanca. Ela publicou recentemente uma antologia florbeliana em romeno com o título SĂ IUBESC! (AMAR!), com 53 sonetos, o diário e algumas cartas escolhidas do livro Perdidamente pelo que, ao iniciar a versão romena das Histórias de mulheres, se sentiu em imediata sintonia com o universo ficcional regiano.



Também este ano é esperada a estreia amadora de uma peça de Régio na capital romena, Bucareste.

Contamos apresentar aqui uma pequena entrevista com a tradutora e poetisa romena, que recebeu recentemente o diploma de mérito do I. Camões por ocasião da visita do Presidente de Portugal à Roménia, tão logo terminem os seus trabalhos de tradução das Histórias de mulheres.

Abaixo pode ler-se a versão romena de 'Fado Português', de José Régio, na adaptação de Amália Rodrigues (outra paixão comum entre Régio e Georgiana), na qual se atesta a perfeita correspondência rítmica e rimática do trabalho desta infatigável promotora da lusofilia estrangeira:



05 julho 2015

Nova gravação do 'Fado Português' de José Régio cantado por Amália Rodrigues


Amália Rodrigues "inventou maneira de cantar intemporal"

Amália Rodrigues "inventou uma maneira de cantar que é intemporal", disse à Lusa o investigador Frederico Santiago, que coordenou a edição celebrativa do cinquentenário do álbum 'Fado português', que revela inéditos da fadista e os ensaios em estúdio.Lusa
CULTURA
POR LUSA


A edição, que é publicada na próxima sexta-feira, é um duplo CD, em que inclui todas as sessões de gravação feitas na mesma época, nomeadamente gravações inéditas de temas como 'Gaivota' e ‘Leonor’, e ensaios com o compositor Alain Oulman e os guitarristas.

"Ela inventou uma maneira de cantar que é intemporal, que é mais moderna que a de agora, e também mais antiga que a antiga", disse o investigador e musicólogo, segundo o qual, "Amália é um daqueles artistas ao nível do Miguel Ângelo".

Amália "é uma criadora e é de tal maneira grande e tão boa, musical e poeticamente, que se descobrem sempre novas coisas", realçou.

Frederico Santiago afirmou que, por ocasião dos 50 anos da edição do LP "Fado português", aproveitou "para editar todos os temas que foram gravados nas mesmas sessões, e que foram editados em outras edições dispersas".

Quanto à edição a sair na próxima sexta-feira, com dois CD, um contém 22 temas: os 12 do alinhamento original -- ‘Fado português’, ‘Cantiga de amigo’, ‘Si, si, si’, ‘Erros meus’, ‘Nome de rua’, ‘Na esquina de ver o mar’, ‘Gaivota’, ‘Verde, verde’, ‘Paresito faraón’, ‘Sombra’, ‘Fado corrido’ e ‘Ai Mouraria’ -, e dez outros, também gravados na mesma altura, mas não incluídos no LP editado em junho de 1965, entre os quais se contam ‘Espelho quebrado’, ‘Cansaço’, ‘As águias’, ‘Água e mel’, ‘Fandangueiro’ e ‘Lianor’.

O segundo CD é constituído por gravações inéditas, incluindo os ensaios, e uma versão nunca antes editada de ‘Fado português’ (José Régio/Alain Oulman), gravada em 1967, "mas que fazia sentido incluir".

Entre os ensaios agora trazidos à luz do dia, Frederico Santiago destacou o de ‘Havemos de ir a Viana’, cuja versão definitiva Amália gravaria anos mais tarde, e "que foi uma sorte estar completo, e no qual se vê como Amália era experimentalista".

"Ela experimentava muito e tinha um bom gosto tão alto e uma autocrítica muito grande", afirmou Santiago, que acrescentou: "Aquela coisa de ela dizer que 'foi Deus, foi Deus' é uma grande desculpa dela, para não assumir o quão grande era".

"As suas interpretações nunca deixavam de ser espontâneas, mas ela não se encostava a essa espontaneidade, não achava que por tudo lhe sair bem naturalmente, ia trabalhar para que lhe saísse melhor", realçou.

"Ela só por intuição fazia uma obra-prima, mas não se contentava com o muito bom, queria mesmo o excecional", afirmou.

O músico e investigador salientou "o bom gosto profundo" da fadista, "que a faz nunca estar datada". "Ela nunca canta à anos [19]40, ou à anos [19]50. Ela inventou uma maneira de cantar que é intemporal".

Referindo-se ao álbum ‘Fado português’, Frederico Santiago afirmou que "corresponde ao período áureo, do ponto de vista de impulso criativo, de Alain Oulman - cite-se temas como 'A gaivota' e 'Fado português', um tempo em que os dois [Oulman e Amália] trabalhavam muito juntos".

A fadista voltou a gravar temas de Oulman, nomeadamente no álbum ‘Com que voz’, publicado em 1970, e naquele que foi o seu último álbum, ainda em vida, ‘Obsessão’ (1990), nomeadamente os fados ‘Prece’ e ‘Entrega’, ambos com poemas de Pedro Homem de Mello.

O CD ‘Fado português’ inclui poemas, entre outros, de Mendinho, David Mourão-Ferreira, Carlos Conde, Luís de Macedo, Luís de Camões, Jorge Brum do Canto, Carlos Barbosa de Carvalho e Pedro Homem de Mello.

Esta edição inclui um texto de Fernando Dacosta, ‘Alturas de insenso’, no qual afirma que ‘Camões deu-nos a língua, Pessoa o pensamento, Amália a voz’, e reproduz ainda excertos da correspondência trocada entre a fadista e Oulman, e várias fotos, entre elas uma da fadista apreciando a capa do LP original, bem como textos de contextualização de Frederico Santiago.

Num deles, Santiago afirma que, “se alguma vez existiu 'lied' em português, o seu expoente máximo foi a obra de Alain para a voz de Amália”.


Texto de: http://www.noticiasaominuto.com/cultura/415894/amalia-rodrigues-inventou-maneira-de-cantar-intemporal

12 junho 2015

Inaugurados o Hotel José Régio e a Cafetaria José Régio em Portalegre

Inaugurou hoje o Hotel José Régio, juntamente com a Cafetaria José Régio, no Largo do Rossio, em Portalegre.







Hotel: unidade hoteleira de 4 estrelas.
Cafetaria: página da Cafetaria, no antigo Café Facha.

Aspeto da entrada:

Sala de Jantar:

Corredor:

Quartos:



CONTACTOS
Largo António José Lourinho Nº 1, 3 e 5
7300-088 Portalegre

Telefone: (+351) 245 009 190
Fax: (+351) 245 309 113
E-mail: info@hoteljoseregio.com

11 junho 2015

Revista Delfim Santos Studies

Lançado online o novo site da revista Delfim Santos Studies, publicação dedicada à 'Geração de Ouro' portuguesa, a Geração de Régio:


A revista conta já com os números 1 e 2. Em 2017 serão lançados o 3 e o 4.

24 maio 2015

Inauguração da exposição dos quatro irmãos Reis Pereira


Decorre até 10 de setembro a exposição dos desenhos, aguarelas e pinturas de José Régio e dos seus irmãos Julio, Apolinário e João Maria, na galeria de S. Sebastião, em Portalegre.


30 março 2015

Manuela de Sousa Marques


Faleceu hoje a ensaísta e germanista Maria Manuela de Sousa Marques. Regiana entusiasta, aqui recordamos um ensaio seu sobre a estreia de Benilde ou a Virgem-Mãe:


Uma peça de José Régio – A polémica estreia de Benilde ou a Virgem Mãe



  • Ficha Técnica
  • Autoria: José Régio
  • Estreia: Teatro Nacional, Lisboa
  • Data: 25 de novembro de 1947
  • Benilde: Maria Barroso (1925-)
  • Eduardo: Augusto de Figueiredo (1910-1981)


Será Benilde ou a Virgem Mãe uma obra de bom teatro?

Cremos que não, porque não provoca a imediata adesão ou o antagonismo emocional que o teatro requer. Os aplausos (e as manifestações de desfavor) de que foi alvo na sua estreia em certo aspeto podem ter sido um equivoco. Pois a maior parte das manifestações de simpatia dirigiu-se não à peça acabada de representar mas ao grande poeta que é José Régio. Como tal eram sobejamente compreensíveis e fundadas. Poucas são as ocasiões que nos são dadas para prestar homenagem a um autor da categoria de José Régio. Qualquer obra sua é sempre valiosa. Originada numa emoção revivida, nunca poderá ser oca ou meramente artificiosa, terá a sua marca e, mais ou menos bem sucedida artisticamente, será autêntica confissão de uma alma. Eis porque foi triste a incompreensão dos poucos que se opuseram ao aplauso devido ao poeta, voz sagrada da revelação das trevas e da luz da alma humana.

Os discordantes equivocaram-se quanto ao móbil dos aplausos, supondo que se dirigiam aquela peça e principalmente à tendência «mística» que viam por ela defendida. Foi um «não-apoiado» dirigido a uma ideologia que forçada e arbitrariamente lhe atribuíam e que na peça se não proclamava. Tomando a obra por pretexto de sectarismo esqueceram, tal como muitos dos que a aplaudiram, a peça enquanto peça e o significado mais profundo que ela encerrava. E assim se perdeu de vista, numa superficial apreensão das situações do drama, qual a verdadeira ideia que o animava, qual o cerne mais fundo que ele continha. Pretende-se ver na obra uma apologia mística e nesta interpretação infundada se uniram possivelmente certos entusiastas a certos detratores, reagindo cada partido conforme o respetivo credo.

Talvez que uns e outros sentissem mais ou menos lucidamente que uma lacuna qualquer dificilmente detetável impedia, apesar da excelência dos atores, uma total entrega e arrebatamento, ou imediato ódio e recusa por parte do espetador. Faltava o momento de sintonia emocional em adesão ou violenta repulsa que é um dos momentos decisivos do verdadeiro teatro. Este exige satisfação imediata porque para isso ele é representação dramática (gr. δρᾶμα) em presença. E assim é preciso optar por aceitar ou rejeitar o mundo do poeta que neste caso é o mundo tal como o poeta o mostra, segundo a ordem que a sua emoção lhe imprimiu. E essa ordem no teatro tem de ser ordem e não caos de onde muitas ordens poderiam nascer: uma oculta, do autor, e outras dos espetadores. Porque o teatro é lugar de emoção coletiva, ele exige unívoca mensagem.

Sempre se procura no teatro uma mensagem decisiva; é isso que José Régio, a quem alguém chamou já o poeta da indecisão, não nos dá nesta sua peça. Seria a «mística» que os neorrealistas pateadores inventaram onde não se encontrava. E é isso que todos lhe acrescentam para suprir a lacuna. Porque em Benilde não há uma tendência imediatamente detetável. A sua decisão última é a indecisão. Se as palavras finais de Eduardo «Há seres que não são deste mundo! Mas este mundo ficaria menor se eles não passassem por cá» podem implicar valorização do misticismo por parte do autor, se a semiconclusão de Eduardo pretende encaminhar a simpatia do público para a protagonista; o certo é que apesar de tudo há na própria peça elementos de destruição, de tal modo que, tal como a peça nos é apresentada, ela implica em última instância o fracasso do misticismo.

A tensão dramática resulta unicamente da inclinação do autor para na própria subversão recuperar a beleza da crença mística. Mas para esta arquivivência de Régio, indeciso entre Deus e o Diabo, não há solução libertadora. Refletindo no final sobre a peça, vemos o espírito de Régio pairando sobre a sua criação no angustioso dramatismo da alma que não pode optar, dilacerada na oposição entre ciência e fé, realidade e sonho, crença e descrença, jubilosa exaltação e desespero profundo. Sabemos que a sua grandeza está na vivência profunda dessa perene oscilação. Sabemos também que Régio não podia por isso mesmo negar-nos que uma das faces do mundo de Benilde é patológica e miseravelmente terrena, e que o louco tem uma grande parte de responsabilidade na situação criada – o louco de quem Genoveva afirma que não é tão imbecil como parece; nada disto nos nega Régio, mas ao mesmo tempo compraz-se em negar emocionalmente esta miséria deliciando-se na revelação da beleza poética dos êxtases.

É subtil e poeticamente eficiente para quem lê a sua obra poética. Porém Régio esquece que destinou Benilde ao teatro, e que não é só o pathos lírico que nos impressiona no palco. Esquece também que a sua indecisão provoca no público um mal-estar que dificulta a simpatia pelos voos místicos da protagonista e pela subtil tensão emocional que não permite que a repulsa tome a primazia. Nenhum destes sentimentos se define para se sobrepor ao seu contrário, criando assim um mal-estar que esfria a nossa emoção. No teatro vamos procurar a empatia. Régio, mesmo formalmente, na linguagem que usou, teve um cuidado realista que imprime à peça o aspeto de uma ocorrência real sem fazer intervir a informação formativa da mensagem do autor. Há porém uma mensagem, como já dissemos: a indecisão. Paradoxalmente, e como era de esperar, Régio decide-se pela indecisão. Porém talvez o teatro exija uma mensagem mais simples e imediatamente acessível.


Manuela de Sousa Marques
1947, 2009.

texto em: http://manuela.delfimsantos.net/Regio.html


Todos me vão morrendo, — todos que eram a árvore de que fui um dos ramos.
Cada um que partiu me levou um pedaço vivo da alma.
E agora, partiu Quem amei sobre todas as pessoas do mundo. Já sou um ramo partido que apodrece no chão.


José Régio, A corda tensa, Colheita da Tarde

26 março 2015

Henrique Villaret escreve biografia de João Villaret destacando a correspondência com José Régio


Henrique Villaret escreve biografia de João Villaret


João Villaret - Duas mãos que abertas deram tudo


Esta fotobiografia escrita por Henrique Villaret, foi apresentada no dia 27 de Março no Salão Nobre do Teatro Nacional D. Maria II.

Resultado de um longo trabalho de investigação, recolha e organização, esta obra comemorativa do centenário do nascimento de João Villaret (1913-1961) inclui inéditos da vida artística daquele a quem em Portugal chamavam «Génio Dramático» e no Brasil «Milagre Humano».

Com capa dura, tem 520 páginas. PORÉM, LAMENTA-SE A AUSÊNCIA DO ÍNDICE ONOMÁSTICO, INDISPENSÁVEL NUMA OBRA DESTE TIPO.

Ao longo do livro, é de destacar a correspondência com António Botto, Miguel Torga, Palmira Bastos, João Gaspar Simões, Alfredo Cortez, José Régio...

LER MAIS AQUI
E EM: 'CORRESPONDÊNCIA' 2015.

Livro de poemas de Barroso da Fonte "Braços duma cruz" transcreve carta de José Régio



Durante algum tempo desconheci a criatividade poética de Barroso da Fonte e com o seu livro «Braços duma Cruz», pude saborear 122 poemas da sua juventude, de 1958 a 1961, que estavam perdidos no meio de outro imenso espólio bibliográfico.

É uma edição fac-similada e bem coordenada pelo seu filho, João Pedro Miranda, da Editora Cidade-Berço, de 2015, em que Barroso da Fonte usava o pseudónimo raiano de João Montaño.

Tem uma cruz na capa e a contracapa é a reprodução de uma carta manuscrita de 10.09.1966, que lhe endereçou o escritor José Régio já doente, três anos antes de falecer, agradecendo-lhe os livros «Neves e Altura» e «Formas e Sombras» e diz-lhe:

«(…) O meu Amigo tem que dizer e di-lo, - não se acorrente à moda dos formalismos requintados e ocos. (…)
Também lhe aconselharia a leitura dos nossos grandes poetas e prosadores clássicos (…).
De vez em vez, há versos bastante felizes, versos cheios, nos seus poemas (…)».


O «Preâmbulo» dos «Braços duma Cruz» é assinado pelo João Montaño, tão destemido e de rosto inteiro como Barroso da Fonte que conhecemos e diz-nos:

«acima de tudo amo a lealdade. Poderia ocultar muitos destes versos censuráveis, (…) aproveito tudo quanto tenho de bom e mau».

Amigo leitor, se tiver oportunidade, leia este livro raro, de edição limitada, de belos poemas, dum poeta «antes quebrar que torcer», podendo ser pedido para ecb@mail.pt.

Ler mais em: http://tempocaminhado.blogspot.pt/2015/03/livro-bracos-duma-cruz-com-carta.html.

Ver carta em CARTAS AVULSAS DE JOSÉ RÉGIO.






25 março 2015

Morte de José Régio


A morte de José Régio numa carta inédita de Luís Amaro para Jorge de Sena



[Lisboa,] 31 de Dezembro 69.

Portugália Editora, Lda.
Apartado 289 – Lisboa
Avenida da Liberdade, 13, 3.º D.
Telefones 32 34 38 – 32 53 04 – 32 59 91
Lisboa-2
Portugal



Meu querido Amigo:

Neste trinta e um em que lhe escrevo, vai, com o meu muito saudar, o desejo ardente de um 1970 feliz, com saúde e novos belos livros.

[...]

Então que me diz à morte do [José] Régio, na manhã de 21 para 22 deste mês – isto é, às 7 horas (provavelmente) da manhã de segunda feira penúltima? No sábado o [Alberto de] Serpa já me tinha dito que eram de aceitar as piores perspetivas (o estado dele tinha-se agravado na última semana). E eu devia ter ido visitá-lo logo nesse mesmo fim de semana, e até antes. Mas não fui. A minha ida a Vila do Conde esteve iminente uma vez, mas o [João] Gaspar Simões desencontrou-se comigo (iria no carro dele) e não fui; depois disso, o Régio melhorou, para voltar a piorar – e assim, aos altos e baixos, esteve a saúde dele nestes últimos meses do ano. Na madrugada em que morreu estivera a palestrar com o rapaz que incansável e dedicadissimamente lhe serviu de enfermeiro (emagreceu 10 quilos, o pobre rapaz!); às 5 horas decidira descansarem um pouco, o rapaz adormeceu sentado num sofá, e o Régio dispôs-se também a fechar os olhos. Às 7 ou 7 e meia, passou lá por casa o primo médico, que foi dar com o doente já morto, com a campainha na mão inerte, a cabeça tombada para o lado, serenamente. Supõe-se que teria tido outro enfarte ao passar pelo sono, morrendo assim sem que ninguém lhe tivesse assistido. O tal rapaz (que de dia trabalhava numa casa em frente, de artigos elétricos) ficou impressionadíssimo, mas todos reconhecem que não pôde fazer mais: a sua dedicação foi total. Ninguém melhor do que ele poderia contar, aos biógrafos do Poeta, o que foram os seus últimos meses.

Como não podia deixar de ser, fui ao funeral – e lá estive, pela vez primeira, na velha casa do Poeta, que na verdade não tinha condições nenhumas para abrigar um doente daquela gravidade. Mas ele assim quis, e ninguém o demoveu – apesar de amar a Vida, como bem se reflete no poema que, já doente, me mandou para a tal página (que continuo lentamente organizando) do Estadão; não creio que a poesia tivesse sido escrita já depois de adoecer, ainda que saiba que, já depois de doente e apesar de rigorosamente proibido de fazer qualquer esforço, ele ainda escreveu algumas páginas do último volume da Velha Casa ou da Confissão dum Homem Religioso em que trabalhava (a propósito, envio-lhe também um trecho, que a Flama publica no n.º de hoje e numa reportagem ao escritor consagrada, que é na verdade um perfeito autorretrato e condiz com palavras que ouvi ao poeta numa tarde em que, aqui na Portugália, há uns 6 anos, o reconciliei com o Edm[undo] de Bettencourt – para afinal não mais voltarem a contactar... O [José] Régio ainda pensou, e quis, escrever um artigo sobre os seus [de Bettencourt] Poemas, mas desistiu, talvez por solidariedade para com o [João] G[aspar] Simões. Sei ainda, porque ele mo disse, que o Bettencourt foi das pessoas que ele mais estimou nos seus tempos de Coimbra: tinha por ele uma amizade quase apaixonada, segundo depreendi quando me disse que chegava a levantar-se da cama para ir ter com o Bettencourt [para] reiniciar discussões que tinham deixado em suspenso. Mas, quanto a mim e decerto quanto a toda a gente, o Bettencourt, embora inteligentíssimo, foi pessoa que parou no tempo: incorrigível preguiçoso, a sua cultura e a sua poesia devem ter-se quedado há muitíssimos anos para a posteridade – oxalá me enganasse! – Mas afinal o que eu ouvi nessa tarde reconciliatória foi isto: que, acreditando firmemente em Deus, [Régio] tinha da humanidade uma visão muito precária, isto é: não acreditava nos valores humanos, mas [nos] divinos. Isto condiz com o que vejo agora reproduzido na Flama, numa crónica destacada, belamente ilustrada, mas escrita por um jovem receoso de dizer que a obra de [José] Régio é de facto grande, e bela, e paira acima, infinitamente, dos gostos circunstanciais da mocidade que passa...

A propósito, envio-lhe um recorte miserável, da ‘Nota’ publicada na Vida Mundial (e que presumo escrita pelo [António] Valdemar – sem disso poder ter a certeza). Veja que infâmia! Começa logo pelo pretenso desacordo entre o «coração» e a «frieza» do criador-poeta: como se nos últimos livros não estivesse bem à mostra, e talvez demais até, uma sensibilidade, um quase-romantismo (em que não faltam expressões em desuso, como «arrebol», rosas desfolhadas, etc., que o Poeta decerto empregava conscientemente, marimbando-se para os jovenzinhos a quem elas horrorizam: se essas expressões condiziam com determinadas vivências suas, porque não havia de usá-las, como puro lírico que foi nessa última fase?). Dir-se-ia que o articulista proíbe os poetas-críticos de adoecerem do coração e muito menos de morrerem dele... Já fica prevenido, meu Caro Jorge de Sena!


Não: toda esta republicazinha precisa muito de si. É um crime que o meu Amigo se recuse a escrever sobre os contemporâneos, como vem acontecendo desde há anos (com raras exceções, uma delas, muito recente, para o Helder Macedo). Não. Assim, deixa o quintal das letras entregue apenas ao despotismo dos jovens que julgam dizer a última palavra! Um artigo seu sobre o [José] Régio, agora, a pôr os pontos nos ii, é indispensável. Creio que a Natércia [Freire] tenciona publicar uma Página especial dedicada ao Homem das Encruzilhadas [de Deus] (e humanamente V. sabe bem que o retrato da V[ida] Mundial é de uma parcialidade atroz: se Régio era orgulhoso, e complicado, e contraditório (?), era também de uma extraordinária humanidade que está bem patente nas suas figuras do povo na Velha Casa e nas Histórias de Mulheres, e era uma pessoa simultaneamente humilde, tímida, adorável companheiro pela simplicidade franciscana. É certo que eu não conheci o Régio intimamente – claro que também a mim, tímido mais que todos, ele de certo modo assustava pela inteligência analítica que se lhe reconhecia. Ah, mas nos meus breves encontros com o Régio, e nos almoços com ele quando vinha a Lisboa, era bem o homem simples, igual-aos-outros, apreciador de um arrozinho doce no Mesquita (restaurante que o deixou encantado) e dialogando à vontade com uma criança ou com um pobre-diabo, sem pose nem encadernações de grande homem, nada régio, mesmo... Sabemos que por trás de tudo isso estava uma inteligência que não dormia, o tal orgulho, o tal feroz sentido de independência, etc. Mas, meu Deus, então a sua Poesia não reflete magistralmente todo esse dualismo? E os seus romances também não?).

Basta de falar de um assunto que o meu Amigo conhece muito melhor do que eu. Ah, é verdade: aqui na casa gostariam de publicar um trabalho seu sobre o [José] Régio – estará disposto a fazê-lo? Claro que o tal velho projeto seu, ou o contrato até para a Arcádia, se esfuma no tempo, cada vez mais esfumado... ou não? Oxalá que não.

[...]

Enfim, basta de conversa (aproveitei umas horas em que me deixaram em paz, para falar destas muitas e variadas coisas, algumas das quais com interesse para a casa. Aliás conversar consigo, mesmo assim ao correr da máquina, foi sempre para mim um prazer raro).


Adeus, querido e eminente Amigo! Bom Ano para si, para D. Mécia, para todo o clã, e o abraço apertado do seu velho e dedicado

Luís Amaro


11 março 2015

'Os poetas' de José Régio em novo disco do cantor José Cid



Chega em abril o novo álbum de José Cid. Menino-Prodígio , «álbum muito roqueiro, muito verdadeiro e completamente analógico», terá festa de lançamento a 5 desse mês e Cid avança à BLITZ que o mesmo foi gravado apenas com três músicos: Luís Varatojo (Pólo Norte) na bateria, Chico Martins nas guitarras e contrabaixo e Cid em órgão hammond. Convidados especiais, refere Cid, apenas um: o escritor José Régio, que «oferece» a letra a uma das canções.

Ler mais aqui.

«Há ainda, neste disco, um poema brutal de José Régio, ‘Os poetas (Há certos Reis…)’, que é muito interveniente, que tem tudo a ver com a atual situação política, não só do país, como global», sentenciou (...)».

Ler mais aqui.

19 fevereiro 2015

Textos de José Régio em espetáculo de São Paulo

“Puzzle (D)” entrelaça textos variados

“Puzzle” nasceu em 2013 na Feira do Livro de Frankfurt e traz crítica ao Brasil.




O cenário, assinado por Daniela Thomas e Felipe Tassara, resume-se a camadas de papel em branco, que, ao longo do espetáculo, ganham cores e letras. Não existe história, pelo menos história linear, com princípio, meio e fim. “Puzzle (D)”, espetáculo de Felipe Hirsch que estreou na última semana no Sesc Vila Mariana, é uma “jam” literária.


“Tem muito improviso. Construímos com a Sutil (Sutil Companhia de Teatro) uma linguagem forte. E agora encontrei outra linguagem”, comenta Hirsch, sentado na plateia do teatro, enquanto o cenário em branco vai sendo construído. “Queria fazer algo importante. Não um arrasa quarteirão. Mas no sentido de importância histórica. O teatro foi colocado de lado, como um primo pobre”.


O projeto “Puzzle” nasceu para o público na Feira do Livro de Frankfurt, em 2013, ano em que o Brasil foi homenageado. Estrearam na cidade alemã as três primeiras partes, A, B, e C. Ao todo, mais de sete horas em cena. Como um quebra-cabeças, trazia fragmentos de textos assinados por autores como Amilcar Bettega Barbosa, André Sant’Anna, Bernardo Carvalho, Jorge Mautner, Paulo Leminski e Veronica Stigger.


O tríptico acendeu a crítica da Alemanha, que derramou elogios sobre o diretor brasileiro. Não havia ali, naquelas sete horas de espetáculo, o Brasil clichê, do sol, do carnaval e das bundas. E, sim, um Brasil cru, marcado pela violência, pela desigualdade social, pelo consumo desenfreado, pela pobreza estética do novos ricos. “O sucesso na Alemanha deveu-se ao tom provocativo. Puzzle é como um Samurai, é preciso”, diz Hirsch.


“Puzzle (D)”, inédito em São Paulo (estreou em Santos, no festival Mirada 2014), entrelaça textos de Mário de Andrade, Haroldo de Campos, 
José Régio, Roberto Bolaños, Paulo Leminski e André Sant’Anna. No elenco, Georgette Fadel, Luiz Paetow, Magali Biff, Guilherme Weber, Luna Martinelli, Isabel Teixeira e o argentino Javier Drolas.

O espetáculo tem 60 minutos de duração. Começa resgatando artistas da Semana de Arte Moderna de 1992. “São pessoas que pensaram a arte brasileira numa escala universal”, ressalta Hirsch. Segue contrapondo o olhar crítico dos manifestos paulistas com aquilo que o diretor chama de “ufanismo vazio”. Neste momento, entra em cena o livro “O Brasil é Bom”, de André Sant’Anna. “Esta segunda parte é dedicada ao ufanismo vazio, o Brasil é bom porque é bom”, diz Hirsch.


A terceira e última parte fala da solidão da língua portuguesa na América Latina. Uma citação do escritor mexicano Roberto Bolaño (1929-2014) funciona como uma facada no estômago do Brasil. “O discurso dele é desagradável. Reflete sobre a Academia Brasileira de Letras, que tem Paulo Coelho como um dos seus membros, com a justificativa de que este divulga a língua ‘brasileira’”, conta Hirsch.

“Puzzle (D)”
Sexta-feira e sábado, às 21 horas; domingo, às 18 horas
Sesc Vila Mariana
Rua Pelotas, 141
Inf. 5080-3000
Até 8/3

21 janeiro 2015

Evocação de Orlando Taipa pelo seu neto - 1

No Bom Pastor

Sento-me ao canto, perto da janela que há já muito tempo espreita a esquina. As mesas, redondas e pequenas, são, no mínimo, muito parecidas com as da minha memória. O tecto conserva a âncora dourada, recordando a firmeza dos ventos que aqui me foram soprados.

Foi o meu avô materno quem mos soprou. Homem grande – não só no físico
, já ralo de cabelo, trazia-me aqui, conversava comigo, mimava-me com sumos, bolos, e sobretudo rebuçados. Frescos pedaços de mel endurecido que me calavam enquanto este ou aquele senhor trocavam ideias com o meu avô.

O meu avô, homem de letras, filosofia e História, adorava conversar, discutir ideias. Adorava os netos e trazia-os às conversas. Eu não percebia nada, mas parecia sempre que discutiam coisas sérias e importantes. Ou talvez não.
 
Está mais pequeno, o café. É agora mais da esquina, encolhido. Mas a lembrança do meu avô não desaparece, antes se dilui por estas mesas da minha memória, aperfeiçoadas pelo tempo, como um exemplo que só posso sonhar alcançar. Não por falta de vontade, mas porque o céu não mo permite…: o Dr. Orlando Taipa é, na minha lembrança, maior que o tecto azul em cujas nuvens me perco. Mas tenho sempre a ténue esperança de um dia ser metade do homem que o meu avô é na memória que tenho dele.

 Gonçalo Taipa Teixeira

22 de Novembro de 2002, Vila do Conde (Café Bom Pastor)

13 janeiro 2015

Poetas da presença - 2 - Cristovam Pavia


Filho de um poeta da presença, Cristovam Pavia pertenceu à geração de 50 que tomou Régio como mestre e cultivou um certo revivalismo da poética presencista, a que chamaremos o neopresencismo. Pelo seu espírito e pelas suas ligações familiares, Cristovam Pavia é definitivamente digno do título de neopresencista.

(1933-1968)


Cristovam Pavia é o pseudónimo de Francisco António Lahmeyer Flores Bugalho, filho do poeta Francisco Bugalho e neto materno do Prof. António Flores.


Nascido em Lisboa, aqui morreu, com 35 anos apenas, a 13 de Outubro de 1968 – no mesmo dia em que no Brasil faleceu Manuel Bandeira, um dos seus poetas mais amados (alguns dos outros: Rainer Maria Rilke, sobre quem preparava, sem jamais a acabar, a tese de licenciatura; José Régio, a quem pelas noites fora escrevia cartas que eram a arrebatada confissão de vivências espirituais; Adolfo Casais Monteiro e Jorge de Sena, de quem nos falava com ardor).

Passou a infância e parte da adolescência em Castelo de Vide, nas quintas familiares que nos versos tão limpidamente evoca. Frequentou as Faculdades de Direito e de Letras, em Lisboa, e estudou também na Alemanha, onde, de outra ocasião, longamente permaneceu a tratar-se da afeção nervosa que veio, talvez, a causar-lhe a morte sob os rodados de um comboio. A sua voz, que de algum modo se identifica com a de Sebastião da Gama – que ele intimamente conheceu –, é, no coral da jovem poesia portuguesa, uma das mais puras e mais poéticas (no sentido em que a poesia transcende a pesquisa meramente cerebral de engenhosas formas verbais, para ser a transfiguração, através da palavra escrita, de sentimentos, ideias, emoções, experiências – de toda a humanidade do poeta, em suma).

Na sua densa concisão, os únicos 35 Poemas que nos legou bem merecem estas certeiras palavras do seu mestre José Régio: «Poesia não realista, não descritiva, não retórica, – exigente e discreta, de bom gosto, direta às vezes outras vezes exprimindo por alusões e sugestões, próxima do vago da música. Frequentemente hermética, então de aquele hermetismo ou semi-hermetismo, que é o autenticamente poético, por natural e boa parte da alta poesia».


Luís Amaro
Artigo no Diário de Notícias.

Obra poética


1. Cristovam Pavia (1959) 35 Poemas, col. 'Círculo de Poesia', 6, Lisboa: Morais.


2. Cristovam Pavia (1982) Poesia, col. 'Círculo de Poesia', 108, Lisboa: Moraes.
3. Cristovam Pavia (2010) Poesia, Lisboa: Dom Quixote.

















Bibliografia

  • João Gaspar SIMÕES (1962) 35 Poemas, Crítica II, 2.º vol. (1943-1961), 285-290; 
  • Maria Aliete GALHOZ (1968) Deixei-te só à hora de morrer, Supl. lit., A Capital, Lisboa, 20.11; 
  • Fernando J. B. MARTINHO (1968) Na Morte de Cristovam Pavia, Sup. lit., Diário de Lisboa, Lisboa, 28.11, 5; 
  • Alberto Vaz da SILVA, João Bénard da COSTA, M. S. LOURENÇO, Nuno de BRAGANÇA e Pedro TAMEN (1968) In memoriam Cristovam Pavia, O Tempo e o Modo 64, 65, 66, Lisboa; 
  • José RÉGIO (1969) Cristovam Pavia e os '35 Poemas', Das Artes, das Letras, Supl. lit., O Primeiro de Janeiro, Porto, 29.01; (1994) reprod. em CRÍTICA E ENSAIO/2, col. 'Obras Escolhidas', s/l: Círculo de Leitores, 338-343. 
  • António Ramos ROSA (1969) Nótula crítico-biográfica, Líricas Portuguesas – 4.ª série, Lisboa: Portugália, 91-96. 
  • Célia da Rocha GOMES (2003) «UMA VOZ SERENA DE INFÂNCIA» em '35 Poemas' de Cristovam Pavia, Dissertação de Mestrado em Literaturas Românicas Modernas e Contemporâneas apresentada à Faculdade de Letras da Universidade do Porto, Porto. 
  • Fernando J.B. MARTINHO (2010) Prefácio e nota biográfica, Cristovam Pavia, Poesia, Lisboa: Dom Quixote. 



José Régio com Cristovam Pavia


______________

REQUIEM


(ao menino morto, eu próprio)

A tarde declina com uma luz ténue.
Estou grave e calmo,
E não preciso de ninguém
Nem a luz da tarde me comove: entendo-a.
Até as imagens me são inúteis porque contemplo tudo.


Os ventos rodam, rodam, gemem e cantam
E voltam. São os mesmos:
Como os conheço desde a infância!
E a terra húmida das tapadas da quinta...
O estrume da égua morta quando eu tinha seis anos
Gira transparente nesta brisa fria...
(Na noite gotas de orvalho sumiam-se sob as folhas das ervas...)


Oh, não há solidão nas neblinas de inverno
Pela erma planície...
E foi engano julgar-te morto e tão só nas tapadas em silêncio...
Agora sei que vives mais
Porque começo a sentir a tua presença, grande como o silêncio...
Já me não vem a vaga tristeza do teu chamamento longínquo.
Já me confundo contigo.



POEMA
(de uma fotografia de meu Pai comigo,
pequeno de meses, ao colo)

Vamos através do incêndio
Mas não temas, meu filho.
Podes dormir nos meus braços frescos e fortes,
Embala-te a cadência dos meus passos.

Vamos através do incêndio
E sonhas.
Detrás das tuas pálpebras a tarde
Beija e doira as folhas dos sobreiros.

E quase me esqueço
Deste puro fogo,
P’ra te dar frescura.
Arde o meu sangue calmo,
E o meu suor, arde.

E devagar,
Vamos através do incêndio.

Dorme, meu filho.



MAIS UMA POESIA A NOSSA SENHORA


Trago-Vos rosas vermelhas, rosas pálidas, rosas brancas...
Trago-Vos violetas e margaridas
Em molhos orvalhados...
Trago-Vos a alegria dos campos...
A claridade do céu azul reflectido nas águas...
Trago-Vos o meu amor natural e fresco

Entre as outras flores...



«O POEMA QUE HEI DE ESCREVER...»


O poema que hei de escrever para ti, dando notícias
Do último reduto das coisas, das profundidades intactas,
Nasce, adormece e referve-me no sangue
Com a íntima lentidão dos teus seios desabrochando,
Porque, sei, não estás longe (nem da minha vida!), meu mistério fiel.
Hoje a nossa companhia é a tua inconsciência e o teu instinto: puro
Instinto que eu, de longe, embalo e velo
E acordará («em frente!») às primeiras palavras
Do poema, quando ele despontar.


Cristovam Pavia, 35 Poemas



_____________


Efeméride



13 DE OUTUBRO - CRISTOVAM PAVIA

Cristovam Pavia, de seu verdadeiro nome Francisco António Lahmeyer Flores Bugalho, poeta português, morreu em Lisboa no dia 13 de Outubro de 1968. Nascera, igualmente na capital portuguesa, em 7 de Outubro de 1933, tendo passado a infância em Castelo de Vide. Era filho do também poeta Francisco Bugalho, da geração da revista Presença. Utilizou igualmente os pseudónimos Sisto Esfudo, Marcos Trigo e Dr. Geraldo Menezes da Cunha Ferreira.

A partir de 1940, residiu em Lisboa, onde terminou os estudos liceais. Frequentou depois a Faculdade de Direito de Lisboa, que abandonou para ingressar na Faculdade de Letras.

Entre 1960 e a sua morte, trabalhou na construção civil, vivendo entre Lisboa, Castelo de Vide, Paris e Heidelberg, onde recebeu acompanhamento psicoterapêutico.

A sua única obra poética editada em vida, 35 Poemas, data de 1959, embora tenha colaborado com poesias de sua autoria em diversos jornais e revistas, como Diário Popular, Árvore, Anteu, Távola Redonda e Serões. Morreu, prematuramente, seis dias depois de ter completado 35 anos de idade.